
O Conto do Fae: Asas do Destino
"Você tem medo da escuridão?"
Os sonhos de Ella de finalmente conquistar suas asas são destruídos quando uma tragédia atinge sua aldeia, poucas semanas antes de seu aniversário de maioridade. Então, chega a exigência do Reino: uma consorte deve ser enviada a um príncipe que ninguém ousa mencionar — o meio-vampiro preso em sussurros e sombras. Todos esperam que alguém seja escolhido. Ninguém espera que Ella se ofereça como voluntária.
Movida apenas pelo instinto e por uma chama que não consegue explicar, ela adentra um mundo de magia obscura, segredos ancestrais e um príncipe que pode ser muito mais do que lenda. O poder treme ao alcance de seus dedos, mas o preço de tocá-lo pode ser seu coração. Ou algo pior.
Em um reino onde o destino morde tão forte quanto presas, Ella não luta apenas por uma coroa, ela luta para se tornar algo além do que qualquer um imaginou.
Moriella de Marshpoint
“Você tem medo do escuro?”
Ela se virou, mas não havia ninguém ali. Apenas sombras, movendo-se como fumaça ao redor de seus pés e se espalhando para sempre na escuridão.
Uma borboleta esteve ali um momento antes — laranja, como fogo — mas agora tinha desaparecido.
A escuridão se movia em volta dela, lenta e constante, como uma respiração.
“A falta de luz não te assusta?” A voz flutuou pelo ar, suave como seda e profunda o bastante para se alojar debaixo de sua pele.
Não a assustava. A deixava curiosa.
“Não” ela disse baixinho, sem ter certeza se havia falado em voz alta.
O ar mudou. Calor tocou suas costas. Uma presença cresceu atrás dela, ficando mais forte.
Ela esticou a mão para trás, e...
“Moriella Briarsand!” O nome rasgou o chão, acordando Ella de repente.
Não era um demônio. Pior. Era sua mãe.
“Por que estou te ouvindo roncar em vez de te ver nos campos?” sua mãe gritou.
“Já vou, mamãe” ela disse com voz cansada. Passou a mão pela camisa amassada que tinha usado na noite anterior, bebendo cerveja com os amigos.
Na bacia de água, jogou água fria no rosto. O sonho ficou por mais um momento — sombra, uma voz tranquilizadora — depois se foi, como os sonhos costumam ir.
Suas tranças castanho-avermelhadas estavam uma bagunça, mas ela não ligava. Não era arrumada, mas parecia ela mesma — e isso já era bom o suficiente.
Ella desceu as escadas de dois em dois degraus.
“Bom dia, bom dia, já estou indo!”
A cozinha estava cheia de luz do sol. A claridade brilhava sobre fileiras de potes cuidadosamente etiquetados de especiarias e ervas que ficavam nas prateleiras de carvalho.
Sua mãe, Samera, estava no fogão, cortando um pão quentinho. Uma de suas asas de bronze emplumadas se moveu atrás dela, um sinal claro de que estava irritada.
“Pelo menos coma alguma coisa antes que as ervas daninhas te devorem” ela disse. “Você ficou pele e osso nesses últimos dois anos.”
Ella não podia negar. Seu último estirão de crescimento tinha a deixado alta e magra — alta e magra demais, mas ainda desajeitada.
“Banha, por favor?” ela pediu.
Samera suspirou e pegou a lata.
“Sim, sim. Mas seja rápida. Seu pai está prestes a tocar o sino.”
Ella fez uma careta. O sino significava que precisavam de ajuda nos campos, e se ela não chegasse primeiro, os filhos do vizinho chegariam.
Não só seu pai teria que pagar a eles, como os garotos passariam o tempo todo provocando Ella por não ser tão forte quanto eles.
Não tinha sido culpa dela, seu pai sempre a lembrava. Não era culpa de ninguém.
Ela foi criada na vida da fazenda desde os quatro anos, mãos pequenas aprendendo o ritmo da terra e do solo.
Quando seus pais decidiram ter outro filho, não sabiam o que o nascimento traria.
Seu irmão, Puckaelow (embora todos o chamassem de Puck), teve que ser cortado do corpo da mãe. Ele nascera com asas, finas e brilhantes, movendo-se antes que pudesse chorar. Asas que não deveriam ter vindo até seu vigésimo ano.
Seus primeiros passos nunca tocaram a terra. Em vez disso, ele flutuou para cima, um bebê risonho que bateu no teto antes de aprender a engatinhar.
Mas aos três anos de idade, as penas começaram a cair, saindo em tufos. Ninguém sabia o motivo. Tudo o que sabiam era que ele estava com uma dor terrível.
As asas foram cortadas de suas costas. E então as pernas de Puck pararam de funcionar.
Isso deixou a família arrasada, e Ella a única criança capaz de fazer trabalho pesado.
Puck, por sua vez, cuidava dos livros de registros, alimentava as galinhas e ajudava a mãe com as refeições.
Ella nunca o provocou sobre seu problema, nem uma vez. Ela temia que quando ganhasse suas próprias asas aos vinte anos, elas também caíssem e morressem.
Aqueles em sua pequena vila que conheciam a história de sua família — que, é claro, era todo mundo — estavam divididos em dois grupos.
Alguns tratavam Ella com carinho, orgulhosos de que ela havia assumido seu papel como a mais velha sem reclamar. Diziam que suas asas, quando viessem, seriam fortes. Assim como ela.
Depois havia os outros. Os que sussurravam sobre uma maldição na família Briarsand, que diziam que mal podiam esperar para ver suas asas feias, se é que ela as teria.
Ela se mantinha longe dos do segundo grupo.
Um cheiro bom ficou no ar, puxando sua atenção de volta ao presente.
Sua mãe lhe entregou a fatia grossa, com banha espalhada. Ella se inclinou e deu um abraço na mãe, o que fez as asas de Samera se moverem de alegria.
Com o pão preso entre os dentes, ela abriu a porta. Puck já estava lá fora em sua cadeira de madeira, rodas fixadas em cada lado.
A seca havia deixado os campos muito secos, e ele se virava bem o suficiente no solo mais duro. Uma tigela estava em seu colo enquanto jogava ração para as galinhas.
Puck viveu mais do que todas as previsões dos curandeiros. Depois da remoção das asas, deram-lhe um mês. Depois um ano. Depois três anos, no máximo.
Agora com quatorze anos, ele ainda tinha seu senso de humor, sempre presente apesar da dor que sentia.
“Que bom ver que você finalmente está se juntando a nós, Ellie” Puck gritou. “Foi sua sombra que vi passando sorrateiramente às três da manhã?”
Suas bochechas ficaram vermelhas.
“Uma moeda pelo meu silêncio?” ele ofereceu.
“Te dou duas se você ficar quieto pelo resto da semana” Ella concordou. Era o aniversário de seu melhor amigo hoje à noite, e se tudo corresse bem com ele ganhando suas próprias asas, as celebrações provavelmente durariam a noite toda.
“Temos um acordo” Puck concordou. “E diga ao papai que já estou quase terminando com as galinhas.”
Ella acenou com a cabeça e se virou em direção aos campos do outro lado do celeiro.
Contra todas as probabilidades, a plantação de selmings de seu pai — um vegetal raro que servia como fertilizante natural — estava indo bem. Era a única coisa mantendo comida na mesa.
Ela o encontrou curvado sobre as fileiras de selming. Sua mão enluvada segurava uma pá, dentes pressionados com força enquanto puxava uma massa de verde retorcido da terra.
As ervas daninhas, se é que podiam ser chamadas assim, não eram pragas normais de jardim. Elas se moviam e estalavam, vinhas se contraindo com força muscular.
Bocas minúsculas, afiadas como espinhos, mordiam suas luvas.
“Puck terminou com as galinhas” Ella disse como cumprimento.
“Se eu não soubesse, diria que você não é mais fã da minha companhia” seu pai respondeu, empurrando a erva daninha para um balde com habilidade praticada.
Ele limpou o cabelo dos olhos, mechas de bronze-acinzentado capturando a luz.
“Peço desculpas por estar atrasada” Ella respondeu. “Claro que amo sua companhia, papai.”
“Você não preferiria estar trabalhando com os três garotos do campo ao lado?”
“Prefiro tomar banho com os porcos.”
Ele riu, o som rico de amor, enquanto ela se agachava ao lado dele. Com um grunhido, ela enfiou a pá no solo.
Uma erva daninha se retorceu quando ela golpeou, movendo-se para fora do caminho. A lâmina atingiu seu lado, e a videira estralou em seu pulso, as pontas de espinhos roçando sua pele.
“Ah, sua desgraçada.” Ela a puxou pela raiz e jogou no balde.
“Moriella Briarsand.” A segunda vez que seu nome completo foi usado naquela manhã. “Rezo para que quem você casar goste dessa língua afiada.”
“A mamãe deveria ter começado as aulas de boas maneiras quando eu estava no útero” Ella respondeu. “Mas achei que você sempre gostou que eu falasse o que penso.”
“Admiro sua força e seu calor” Erannon disse. “Sua inteligência afiada é o que vai te meter em encrenca.”
Ella deu de ombros. Com Puck incapaz de ajudar com a maioria das tarefas, esperava-se que quem Ella casasse assumisse as terras da fazenda Briarsand e a administrasse com ela.
Claro, Ella não tinha vontade de se casar.
Os únicos homens de quem gostava eram seu pai, seu irmão e seu melhor amigo, Sylvan Waylocks. Não o suficiente para casar com ele, mas o suficiente para tolerar sua amizade.
Seu pai continuou:
“Sua prima Rosalia volta em breve, então precisamos trabalhar muito hoje. Amanhã será encurtado.”
Rosalia, com apenas vinte e quatro anos — uma idade muito jovem para uma cônsul — assumiu o trabalho de liderar a vila. Ela esteve fora em uma missão comercial para Evercross, um longo voo até a cidade vizinha.
Rosalia havia negociado seus raros selmings e devia a seu tio sua parte, que precisaria ser acertada durante uma reunião oficial.
“Vamos precisar encurtar hoje também” Ella lembrou-o. “Sylvan nasceu às cinco e doze minutos.”
Seu pai suspirou.
Para provar seu ponto, ela agarrou com a palma da mão quatro ervas daninhas de uma vez. Elas guincharam em protesto, folhas espinhosas movendo-se descontroladamente enquanto tentavam se soltar de seu aperto.
Ela deu uma risada feliz ao jogá-las no balde.
“Pronto. Isso tem que valer alguma coisa.”
“Você economizou dez minutos com isso” seu pai admitiu. “Mas você estava quarenta minutos atrasada.”
Ela sorriu enquanto se curvava para a próxima videira, o ritmo do campo se estabelecendo — pá, puxar, jogar, conversar.
As ervas daninhas estalavam e sibilavam, mas não eram páreo para os Briarsands hoje.
Às três horas, os selmings estavam bem, os porcos estavam alimentados e os tomates maduros haviam sido colhidos.
Ella olhou para o pai, esperando permissão para se limpar antes da cerimônia. Mas a atenção de Erannon estava fixa no céu. Dois Fae estavam descendo em direção a eles.
Ella reconheceu um deles imediatamente — seu primo, Soric. O outro era um assistente da cônsul e mensageiro oficial da vila, um Fae chamado Thistias.
Pelo canto do olho, ela viu Puck empurrando sua cadeira pelos campos, ansioso para ouvir qualquer notícia que estivesse prestes a acontecer.
“Bom dia” Erannon os cumprimentou. “A que devemos sua visita?”
“Minha irmã—” Soric começou, mas Thistias moveu suas asas bruscamente, silenciando-o.
“Lady Rosalia, Cônsul da Vila de Marshpoint” Thistias anunciou, com muito mais pompa do que sua vila simples precisava “adoeceu em nossa viagem de volta. Fomos forçados ao chão em uma estrada difícil. Ela fica doente se tentamos carregá-la. Estamos chamando todos os curandeiros para cuidar dela imediatamente, e quaisquer soldados para guardar em caso de...”
Sua voz parou. O próprio nome deixava muitas pessoas com medo.
“Em caso de vampiros” Erannon completou. “Ainda não anoiteceu e não vai anoitecer por um bom tempo. Vocês não têm motivo para temer. Por favor, encontrarão minha esposa lá dentro — ela cuidará da minha sobrinha. Quer dizer, a Lady Rosalia.”
“E soldados?” Thistias insistiu.
Puck chegou. Suas mãos estavam machucadas de girar as rodas de sua cadeira.
Erannon suspirou.
“Nenhum aqui. Devo cuidar do meu filho. Sou o único que pode levantá-lo sem machucá-lo. E Ella não é guerreira, nem tem vinte anos ainda.”
Ella chutou uma pedrinha solta, forçando os olhos para baixo.
“Tenho certeza de que ela é forte de outras maneiras” Soric preencheu, já que Thistias já havia voado para a casa principal. “Agradecemos.”
Ella fez uma nota mental para adicionar Soric à lista curta de homens que podia tolerar.
“Você acha que Rosalia vai ficar bem?” Puck perguntou.
“Tenho certeza disso” o pai respondeu. “Temos meia dúzia de curandeiros na vila. Ela está em boas mãos. Curioso, o que a fez adoecer?” Ele coçou o nariz pensativo.
“Papai, sei que é uma hora péssima para perguntar—” Ella começou.
“Pode ir. Sei que é a cerimônia do Sylvan em breve, e você está cheirando a terra e porquinhos.”
“Isso é dizer pouco” Puck acrescentou.
“Infelizmente digo, a cerimônia dele não terá muita gente se Rosalia não melhorar” Erannon disse. “Puck e eu vamos tentar ao máximo comparecer. Mais uma tarefa a fazer.”
Com isso, Ella se virou e correu o mais rápido que suas pernas permitiam. A casa apareceu à vista bem quando sua mãe decolou para o céu.















































