Cinco anos atrás, Mithra perdeu seu Mynd. Depois disso, rejeitada pelos únicos colegas que já teve, ela se perde em trabalhos insensatos. Um dia, ela desperta de seu exílio auto-imposto para ajudar a salvar seu navio e as vidas daqueles a bordo, colocando em ação um plano estratégico há muito elaborado. Enquanto Mithra luta para se ajustar à sua nova vida, ela é convidada a se colocar na linha de frente de uma batalha que ela pensava ter sido vencida há muito tempo – uma batalha que a fará questionar tudo o que ela pensava que sabia.
Classificação etária: 18+
"Quando a guerra chega, a primeira vítima é a verdade."
- Hiram Johnson, congressista americano, 1917
Eram nove pessoas, cinco homens e quatro mulheres, em uma nave construída para o dobro.
Claro, mesmo meio cheia, a nave nunca seria classificada como espaçosa, mas a tecnologia ainda não havia chegado ao ponto em que as naves espaciais pudessem conter espaço morto.
Ainda era muito caro construí-las, abastecê-las e fornecê-las; cada centímetro cúbico a bordo precisava ser utilizado para recuperar os custos iniciais de construção. Pelo menos esse era o plano.
Nesta viagem, porém, havia muito espaço vazio e as áreas abertas incomodavam os astronautas. Depois de anos de corredores apertados e cabines menores que beliches militares, parecia estranho flutuar pelos quartos sem esbarrar em objetos ou outras pessoas.
Pior ainda era saber o motivo desse espaço: o programa espacial iria terminar.
Cansado das batalhas constantes acerca do financiamento do programa, o governo mundial finalmente decidiu cortar a verba. Os reclamões haviam vencido.
Lá se vai a jornada às estrelas - a humanidade retornaria a uma vida limitada pelos céus e eventualmente esqueceria que já havia voado através do cosmos.
"Não aguento mais", disparou o astrônomo da missão, desligando o programa de notícias que a Estação de Controle de Solo havia transmitido para eles. "Se eu ouvir mais um terráqueo com um cérebro de ervilha alegar que o financiamento do programa espacial tirou comida da boca de seu filho, eu vou gritar."
"Calma, Zvi," a física alta e de cabelos escuros o acalmou. Seu sotaque italiano tornava suas palavras ainda mais animadas. "Você não deveria deixá-los te irritarem tanto."
"Por que não?" Kim, o xenogeólogo da equipe, resmungou de seu assento na parede oposta. "É culpa deles, e você sabe. Eles destruíram o programa espacial. Somos águas passadas agora. Vamos acabar como uma nota de rodapé nos livros didáticos daqui a alguns anos."
"Não diga isso!" Os olhos de Carlotta demonstravam preocupação. "Este é apenas um retrocesso temporário. Talvez, no próximo ano, eles votem a favor da alocação do dinheiro para nós."
"Ah!" Zvi e Kim fizeram coro.
Eles eram de altura semelhante, embora Kim tivesse a estatura atarracada comum a muitos coreanos, enquanto Zvi tinha ossos pequenos. Sua aparência élfica escondia suas habilidades; além de ser um excelente astrônomo, era um piloto de caça altamente condecorado.
Embora se sentisse mais confortável na cabine de um avião a jato, ele também estava qualificado para pilotar a espaçonave em caso de emergência.
A pilota habitual entrou bem a tempo de ouvir a última parte da conversa. "Vejo que cheguei a tempo de ver as notícias", disse Svetlana, seu sotaque russo nativo quase indetectável.
"Por que eles ainda transmitem isso para nós? São só coisas ruins," Kim disse sombriamente.
"Que pasa? É uma festa privada ou qualquer pessoa pode participar?"
Gutierrez e Rajan chegaram flutuando do laboratório de ciências. Fisiologista e médico, eles eram os únicos membros da tripulação que nunca haviam passado pelo serviço militar.
Gutierrez não teve nem a chance - sua terra natal, a Costa Rica, não tinha exército -, e Rajan simplesmente ingressou no programa espacial assim que terminou sua residência em medicina geral.
"O que está acontecendo aqui? Mal consigo ouvir meus próprios pensamentos! Shiru Oladajo perguntou da porta. Resmas de papel de computador flutuavam atrás dela. "Como devo reconfigurar os computadores se..."
"Não se preocupe," Zvi interrompeu. "Parece que esta será nossa última viagem."
Suas reclamações pararam, e ela olhou para ele com alarme. "É oficial, então?"
"Eles acabaram de anunciar", confirmou Kim. "'O Conselho Mundial, depois de muita deliberação, cedeu às exigências do Movimento da Terra. Todo o dinheiro anteriormente reservado para o programa espacial será agora canalizado para programas sociais para os necessitados do planeta.' Idiotas desgraçados!" ele terminou de forma selvagem. "Que tipo de futuro eles acham que terão sem espaço? Já superamos aquele globo velho e cansado."
"Se esses idiotas gastassem metade do tempo que gastam reclamando sobre o programa espacial, pregando contracepção e conservação, não existiriam tantas pessoas necessitadas em primeiro lugar!" Zvi concordou. "Não podemos sobreviver enquanto todas as famílias do terceiro mundo insistirem em ter oito filhos! E como eles podem nos confinar à Terra quando estamos desperdiçando seus recursos a um ritmo recorde? Se o desmatamento na América do Sul continuar, estaremos todos mortos de fome ou câncer de pele na virada do século!"
Abruptamente, Zvi lembrou-se da presença de Gutierrez. "Desculpe, Juan," ele ofereceu timidamente. "Não quis dizer que os sul-americanos são os únicos que precisam de uma lição sobre preservação."
"Tudo bem", respondeu prontamente o centro-americano. "Seu povo tem irrigado as terras deles por séculos; é natural que você seja um especialista em gestão de terras."
"Como você pode culpar as pessoas por quererem bebês? É um desejo natural! Filhos são parte da humanidade desde Adão e Eva." Os gestos dramáticos de Carlotta enfatizavam suas palavras.
"Falando como membro de uma das nações mais populosas do mundo," Rajan disse lentamente, "sei por experiência própria como é difícil mudar a opinião das pessoas sobre este assunto. Desde o início da história, filhos significam segurança para a velhice, e quanto mais filhos, mais segurança."
"Tentar convencer as pessoas a limitar o tamanho de suas famílias é praticamente impossível. É por isso que entrei no programa espacial em primeiro lugar: pude ver que a humanidade em breve precisará de mais espaço do que a Mãe Terra pode fornecer."
"Ótimo, vocês estão todos reunidos aqui." O comandante da missão lançou-se pela porta, seguido de perto por sua primeira oficial. "Isso me poupa o trabalho de procurá-los. Tenho novidades."
"Nós sabemos", Kim o antecipou. "Ouvimos o anúncio."
"O quê?" Por um momento, o capitão pareceu intrigado, mas depois seu rosto suavizou. "Oh, você quer dizer a reportagem da imprensa sobre o nosso financiamento."
"Tem alguma outra notícia?" Shiru perguntou inexpressivamente.
"Ela está certa," Zvi concordou. "Não há muito que possa competir com a notícia de que somos todos obsoletos."
"Obsoletos? Isso eu não aceito!" Carlotta declarou desafiadoramente. "Teremos mais explorações no futuro, depois que a fúria presente diminuir. Temos que ter!"
"Duvido", respondeu a primeira oficial em tom britânico cortante. Sarah Ellesmere falou com autoridade silenciosa. "Depois que o dinheiro acaba, é quase impossível recuperá-lo. E temos perdido popularidade com o povo. Receio que a gratificação instantânea é tudo o que lhes interessa. Conceitos como futuro, pesquisa básica ou curiosidade intelectual têm muito pouco peso para o eleitorado."
"Eles não passam de uns patetas", o capitão Will Young bufou com desprezo. "Eles não estão apenas enterrando suas cabeças na areia, eles estão encobrindo toda a maldita raça humana."
"Isso é tudo o que faremos?" Svetlana exigiu. "reparar e lamentar?"
"Você quer dizer ’reclamar e lamentar," Zvi corrigiu com um sorriso. Embora o inglês não fosse sua língua nativa, ele falava fluentemente e estava familiarizado com todas as expressões americanas. "E o que mais podemos fazer?"
"Greve?" Carlotta ofereceu sem entusiasmo.
"Você esqueceu que estamos no espaço sideral?" Raj perguntou a ela. "Que tipo de greve podemos fazer? O que poderíamos fazer? Não voltar para casa no dia estabelecido? Nos recusamos a realizar o levantamento científico desta parte do cinturão de asteroides? É tudo imaterial de qualquer forma - não é como se alguém literalmente minerar o cinturão. Pelo menos não é assim agora.."
"E nunca será", Young interveio. "Eu não queria contar a vocês antes, mas nós somos o último voo. Para sempre. Quando voltarmos, o programa espacial será oficialmente dissolvido."
A informação foi chocante. Mesmo depois do anúncio da manhã, eles não tinham percebido que seria tão rápido.
"Somos os últimos?" Gutierrez repetiu lentamente.
Young assentiu. "Vamos lá, por que vocês estão tão surpresos? Nas duas últimas rotações, a tripulação nas estações espaciais foi mínima, e a base lunar já está quase extinta. Os sinais começaram há mais de um ano. Todos no alto escalão da Agência sabiam que era apenas uma questão de tempo antes que o Conselho cedesse, e eles têm discretamente reduzido as instalações orbitais e extra orbitais. Nenhum de vocês notou ~?"
A tripulação trocou olhares constrangidos. "Acho que não", Young disse amargamente. "Vocês não acharam estranho que este grupo em particular foi selecionado para este voo?"
Eles olharam um para o outro. "O que você quer dizer?" Kim foi o primeiro a perguntar, mas os outros ficaram igualmente intrigados.
"Will quer dizer que fomos cuidadosamente selecionados", explicou Sarah, "não apenas por nossas habilidades, mas também por nosso país de origem".
"É mais rentável", Young comentou com uma expressão de desgosto no rosto. "Quando pousarmos e desembarcarmos, os tipos políticos terão um grande dia. Pensem bem: praticamente todos os segmentos do mundo são representados por alguém da tripulação! As Américas, Europa, Oriente Médio, Ásia, África... É como um maldito comercial de refrigerante!"
"Você realmente acredita nisso?" Svetlana perguntou. "É tão... tão... calculado."
"Olha," Will disse impacientemente, "o chefe sabia sobre este anúncio há muito tempo. Eles estão se preparando para isso e nós fazemos parte dessa preparação. Eles sabiam que, com o fim do programa espacial, precisariam encontrar novos empregos e, para conseguir isso, precisariam da boa vontade de alguns grandes políticos. É aí que entramos. Cada um de nós fará parte da história: a tripulação da última exploração espacial. E todas as regiões queriam ser representadas."
"Os burocratas da Agência nos selecionaram em um acordo fechado com o Conselho. Os membros do Conselho conseguiram figuras de proa que poderiam exibir em sessões de fotos, e os caras da Agência conseguiram posições na nova ordem."
"Se isso é verdade, por que não fomos consultados?" Raj perguntou.
"Todos nós já fizemos nosso quinhão de aparições públicas," Sarah os lembrou. "Imagino que os funcionários da Agência pensaram que gostamos deles e gostariam de receber uma sinecura. Eles provavelmente pensaram que estavam nos fazendo um favor, cuidando de nosso futuro."
Os outros membros da tripulação estavam tentando assimilar essa nova informação. Expressões variadas atravessavam seus semblantes: medo, raiva, confusão, pânico…
Por fim, Shiru falou por todos: "Nunca pensei que terminaria assim".
"Nem eu!" Meia dúzia de vozes ecoaram o sentimento.
"Não sei quanto a vocês" — a voz profunda de Young abafou as outras — "mas não pretendo passar o resto da vida aparecendo em inaugurações de shoppings para algum político cabeça-dura."
"Que escolha nós temos?" Gutierrez perguntou, franzindo a testa.
"Vários dias atrás, Will e eu descobrimos algo," Sarah disse cuidadosamente. "Percebemos isso puramente por acaso, escondido atrás de um dos asteroides. Já sabíamos da decisão do Conselho Mundial, então decidimos não notificar o Controle da Missão. Sabíamos que eles simplesmente nos diriam para ignorá-lo."
Young tomou as rédeas da história. "Em vez disso, nos aproximamos. Foi gradual, para que aqueles na Terra não percebessem - não que eles pudessem fazer alguma coisa se percebessem", acrescentou ele em um aparte desdenhoso. "Mas agora chegamos perto o suficiente para ter certeza."
"Certeza de quê?" Zvi pressionou.
"Certeza de que é um objeto de origem alienígena," Sarah disse calmamente.
Por um momento, houve um silêncio mortal. Em seguida, todos começaram a falar ao mesmo tempo, causando caos.
"Vocês não podem manter isso em segredo! O governo-"
."—canais apropriados—"
"—tem alguma ideia do que isso significa? Esta é a descoberta mais importante…"
"Com o que se parece? O que é?"
"—evidência—"
"Puta merda."
"Silêncio! Silêncio! ~" Young berrou até que os outros ficaram quietos mais uma vez.
"Sarah e eu passamos por tudo o que vocês estão sentindo agora", disse ele. "E vou dizer uma coisa, não foi uma decisão fácil manter nossas bocas fechadas. Mas depois de explicarmos nosso raciocínio, acho que vocês vão concordar conosco."
"Will, não estamos preparados para lidar com isso sozinhos!" Raj protestou. "Isso requer especialistas que..."
"Raj, não há ~especialistas para isso. É sem precedentes," Sarah disse gentilmente. "Ninguém está preparado para lidar com isso. Ninguém."
"Olha, se Sarah e eu tivéssemos entrado em contato com a Estação de Controle do Solo quando avistamos o objeto pela primeira vez, eles teriam nos dispensado. Tem havido muitas histórias de monstrinhos verdes e os políticos não querem começar outro caso de Guerra dos Mundos ~. Então, quando tivemos certeza de que era extraterrestre, e não apenas um foguete Soyuz descartado ou lixo espacial, reconsideramos nossa decisão de contar ao solo."
"É disso que precisávamos!" Carlotta disse animadamente. "É isso que vai reviver o programa espacial! Eles não podem acabar com ele agora! Precisamos de naves para examinar isso... isso... seja lá o que for! Será a nossa salvação!"
"Ela está certa!" Kim exclamou. "Rápido! Conte a eles agora!"
"Espere", Young ordenou, levantando a mão. "Deus sabe que segui o protocolo correto durante toda a minha vida, mas dessa vez estou disposto a contrariar o sistema. Pense nisso. Contamos a eles sobre a descoberta, e depois? Os políticos entram em ação, os chefes da Agência se protegem e nós ficamos de fora."
"Você confia que o governo lidará com isso adequadamente?" Sarah perguntou, olhando de uma pessoa para outra. "Porque quando começamos a pensar sobre isso, Will e eu percebemos que não."
Zvi parecia pensativo. "Tenho que admitir, desconfio de qualquer governo que possa acabar com o programa espacial. Se eles são tão míopes…"
"E quanto ao objeto em si?" Will interveio. "Quem sabe que segredos ele contém? O Conselho Mundial ainda é muito novo. Eles já têm problemas suficientes para lidar com pequenas escaramuças entre dois países dos quais ninguém nunca ouviu falar. O que vai acontecer quando os chefões ouvirem sobre a descoberta? Como americano, posso dizer que meu governo ficará muito interessado".
"Assim como a Grã-Bretanha."
"A Índia vai insistir em sua parte justa", Raj assentiu.
"E a Rússia!"
"Não vamos esquecer a China, a África, o Japão, o resto da Comunidade Européia..." A voz de Shiru foi sumindo. "E se os fanáticos no Oriente Médio – oops." Ela olhou desculpando-se para Zvi.
Ele sorriu e deu de ombros, assim como Gutierrez havia feito antes. "Eu sei o que você quer dizer. Isso pode ser a única coisa que pode fazer meu povo e seus inimigos pararem de lutar entre si por tempo suficiente para enfrentar alguém novo."
"Esta descoberta pode muito bem causar a queda do governo mundial", disse Ellesmere sobriamente. "Guerras foram travadas por muito, muito menos."
"Não podemos manter isso em segredo para sempre!" Kim protestou.
"Ninguém está sugerindo isso", respondeu Young. "Sarah e eu achamos que devemos examinar o objeto mais de perto e depois tomar uma decisão fundamentada sobre nosso próximo passo."
Svetlana engoliu em seco. "Eu já imaginava que você iria propor uma coisa dessas."
"Você está se cobrando muito", contestou Rajan, com o rosto enrugado de dúvida e preocupação.
"De todos nós", corrigiu Young. "Mas pense, Raj, quem melhor para decidir? Políticos imediatistas com intenções secretas? Figurões da agência?"
"Nós representamos ~a maioria dos blocos de votação no governo mundial," salientou Sarah.
"Como posso representar toda a África?" Shiru protestou, sua voz esganiçada e agitada.
"Metade da Índia jamais me aceitaria", concordou Raj. "E quanto ao Sudeste Asiático?"
"Sem consultar cada pessoa na Terra individualmente, nunca podemos esperar uma representação completa", respondeu Sarah, "mas cada um de nós está pelo menos um pouco familiarizado com as preocupações específicas de sua terra nativa. Nesse sentido, podemos ~representar nossos países."
"Além disso, confio muito mais no bom senso de vocês do que no de seus políticos. Ou dos meus políticos também", concordou Young. "Por que não deveríamos ~ser os responsáveis portomar uma decisão tão importante? Quem seria uma melhor opção?"
Apesar dos olhares incertos, ninguém expressou uma objeção direta.
Aos cinquenta e um anos, Will Young era anos mais velho do que todos, e ele havia registrado mais tempo no espaço do que qualquer outro no programa. Em uma crise, não havia ninguém melhor; ele era frio e ponderado ao avaliar a situação e abordá-la. Em tempos mais relaxados, no entanto, seu temperamento volátil muitas vezes o colocava em apuros, e ele tinha a profunda desconfiança de autoridade comum a muitos americanos.
Em contraste, as ações de Sarah Ellesmere eram sempre consideradas e cuidadosas. Elas não eram impulsivas, e seu apoio ao plano de Young significava muito para os outros.
Por mais louca que a ideia parecesse, se Sarah a considerava favorável, então poderia valer a pena.
"Will e eu concordamos que tínhamos ido o mais longe possível sem informar o resto de vocês."
"E eu não posso ordenar vocês a agirem", acrescentou Young. "É verdade que nunca fomos muito a favor da disciplina militar, mas uma decisão como essa deve ser unânime."
"Não temos como saber o que encontraríamos", disse Svetlana, inquieta. "E se for perigoso?"
"Devemos estar preparados para destruí-lo." O tom de Sarah era uniforme. "Se necessário, esse poderá ser nosso destino também."
"A nave não foi construída para autodestruição", disse Shiru, com a voz um pouco trêmula. "Como-"
"Isso pode ser facilmente manipulado." Young deu de ombros. "O grande desafio é evitar que ela exploda toda vez que ligamos os motores."
Shiru respirou fundo. "Concordo com a Sarah. Se formos em frente, devemos estar preparados para nos matar para proteger a Terra".
Por mais nervosa que ela soasse, não havia como não notar sua determinação. Aos vinte e seis anos, ela era o membro mais jovem da tripulação e claramente se sentia sobrecarregada por ser solicitada a decidir sobre algo que afetaria o futuro de toda a humanidade.
Sua coragem em enfrentar o problema não passou despercebida por seus pares.
Gutierrez sorriu e deu um aperto rápido no braço dela. "Parece que você decidiu."
"Isso é loucura!" Kim protestou em voz alta.
Reclamar sobre figuras de autoridade era uma coisa; contrariar uma tradição vitalícia de respeito e obediência era outra bem diferente. Ações independentes como essas podem ser consideradas aceitáveis no Ocidente, mas os costumes orientais valorizam muito mais o trabalho dentro do sistema. Cumprir as regras, pelo menos em questões tão cruciais como essa, estava tão arraigado em Kim quanto os rituais cotidianos, como beber chá.
"Não podemos decidir algo assim por conta própria! Você está agindo como um - como um caubói!" ele gritou para Young.
Rajan pôs a mão em seu braço. "Calma, Kim. Pelo menos vamos discutir o assunto com calma."
"Eu concordo com Young e Ellesmere", disse Svetlana categoricamente. "No meu país, sabemos muito bem o dano que líderes incompetentes ou corruptos podem causar. Digo que somos tão qualificados quanto qualquer um para abordar o objeto."
Zvi assentiu. "Se não nós, quem? Se não agora, quando?"
"Si, eu também concordo", Carlotta ecoou os outros. "É necessário."
Kim olhou de um para o outro com frustração e raiva. "Vocês enlouqueceram? Isso não é uma violação de ordens pequena - eles podem atirar em nós por isso! E por que precisamos investigar o objeto ainda mais? Vocês dois afirmaram que é claramente de origem alienígena; isso é o suficiente para reviver o programa espacial!"
"É mesmo?" Sarah exigiu friamente. "Não temos ideia do que seja. Mesmo supondo que seja totalmente benigno e, portanto, não seja motivo para causar uma guerra, ainda assim pode causar problemas. Pense bem, Kim. Voltamos correndo para casa, afirmando que encontramos um artefato alienígena e que o programa espacial deve ser salvo, e todos concordam."
"É mais provável que eles se escondam debaixo das camas no meio de um caos generalizado", Young acrescentou amargamente. "E se eles entrarem em pânico? Protestos e roubos."
Ellesmere ergueu a mão. "Vamos considerar a melhor opção. As pessoas respondem de maneira sensata e as naves são despachadas. Suponho que você concordaria que a única coisa que impediria o surgimento de conflitos é se os esforços acabassem sendo completamente inúteis?"
Kim concordou relutantemente com a cabeça. "Acho que sim."
"Então, a única maneira de evitar a tensão global é formos comprovados como idiotas. Você realmente acha que todas as pessoas que lutam pela dissolução do programa espacial irão nos receber de braços abertos depois que nossa grande descoberta for um... um…"
"-fracasso." Young completou. "No segundo em que eles perceberem que induzimos o Conselho a gastar bilhões de dólares investigando um grande nada, eles vão querer nossas cabeças."
"Seremos insultados, considerados alarmistas perdulários", Sarah continuou inexoravelmente, "e, para muitos, o programa espacial terá se mostrado totalmente inútil. Eles vão encarar a descoberta como prova de que não há nada de importante aqui, e quaisquer esperanças que possamos ter de um dia reviver o programa espacial serão total e completamente frustradas."
Após escutar e assimilar a lógica inescapável de Ellesmere, Kim parecia atormentado. "Entendo seu ponto, mas..."
"Jogar fora minhas responsabilidades não é algo fácil para mim," Sarah adicionou suavemente. "Os conceitos de Rei e país e tudo isso estão enraizados na minha mente também. Mas acho que há momentos em que as responsabilidades vão além do escopo normal."
Rajan soltou a respiração em um grande suspiro. "Confesso que compartilho da opinião de Kim. Não estou acostumado a contornar a hierarquia normal, mas este é um caso especial. Concordo com sua decisão."
Gutierrez concordou com a cabeça. "Vamos torná-la unânime, Kim?"
Por um longo momento, o geólogo coreano olhou pela janela de visualização. Emoções conflitantes percorriam seu rosto. Por fim, ele acenou com a cabeça uma vez. "Tudo bem." Sua voz era pouco mais que um sussurro.